Dicas de Uso

Primeiros socorros em trilhas

Você não precisa ser um socorrista experiente para conseguir ajudar alguém que se machucou no meio da natureza. Mas algumas coisas são fundamentais ter em mente e alguns procedimentos são padrões. A lista a seguir serve apenas para orientá-lo e não pretende substituir um curso prático, que é sempre muito útil para quem está constantemente ao ar livre, longe do acesso a hospitais e socorros profissionais.

Duas coisas são fundamentais: evitar os acidentes e PENSAR! Pense primeiro e aja depois… E não esqueça que a regra de qualquer socorrista é “não se tornar a próxima vítima”!

O que fazer imediatamente após acontecer um acidente?

1. Acima de tudo, mantenha a calma e PENSE! Não existe emergência que não permita gastar alguns poucos segundos pensando na melhor forma de agir.

2. Examine o acidentado cuidadosamente, na exata posição em que foi encontrado – a menos que isso seja impossível. Não o mexa até que você saiba exatamente qual é a seriedade do acidente.

3. Simultaneamente e imediatamente verifique o pulso (coração) e a respiração, checando também a perda exagerada de sangue. Veja como o coração está batendo nas artérias do braço ou do pescoço. E cheque se a pessoa perdeu os sentidos. Estes são os únicos problemas que exigem tratamento imediato, pois são situações que podem matar rapidamente!

4. Em seguida, examine ferimentos na cabeça, choques, fraturas, deslocamentos, lacerações etc.

5. Conforte o acidentado.

6. A pessoa responsável por tomar as decisões e coordenar o trabalho do grupo deve ser a que tem mais experiência em primeiros socorros em ambientes naturais. Lembre-se que é sempre melhor ser ‘pessimista’ e programar para que o grupo evacue o acidentado que, provavelmente, não terá condições de sair do local sozinho, sem ajuda.

7. Se não for possível começar a saída do local imediatamente, coloque o acidentado na forma mais confortável, aquecida, seca e segura possível (dentro do saco de dormir e da barraca, por exemplo).

Alguns fatores logísticos devem ser levados em conta antes de tomar qualquer decisão sobre o que fazer com a pessoa machucada. Após considerá-los com calma e clareza, a possibilidade de tomar decisões sensatas aumentará. São eles:

1. Previsão do tempo

2. Temperatura ambiente

3. Hora do dia e luz natural ainda disponível

4. Membros da equipe, suas condições físicas etc.

5. Conhecimento de primeiros socorros dos membros da equipe

6. Distância da comunicação mais próxima para pedir ajuda

7. Distância do socorro mais próximo, de uma estrada etc.

8. Avaliar o material disponível entre os membros da equipe

9. Avaliar o material disponível na natureza, ao redor

10. Perigos locais – animais peçonhentos, tempestades elétricas etc.

11. Estado mental de cada membro da equipe “Conhecer Primeiros Socorros é saber o que fazer primeiro (e o que fazer em seguida) para salvar a vida de alguém – enquanto um médico ou qualquer ajuda especializada não chegam, ou enquanto vocês não alcançam um hospital”, explica Sergio Beck em seu livreto O livro de Primeiros Socorros em montanha e trilha.

Uma pessoa pode morrer por quatro motivos básicos: por pararem de respirar, por um sangramento grave, porque seu coração parou ou porque seu cérebro foi atingido gravemente e não responde. Um acidente acaba de acontecer na sua frente? Verifique imediatamente se a vítima está desmaiada, se ela respira, se o coração está batendo e se ela sangra muito. Mas deixaremos os casos mais graves para quem entende do assunto (faça cursos periódicos de Primeiros Socorros, esteja sempre atualizado e não deixe de ler O livro de Primeiros Socorros em montanha e trilha, do Sergio Beck). Falemos de casos mais simples mas nem por isso menos difíceis de cuidar, em se tratando de ambientes naturais situados em alguma distância do hospital mais próximo.

Fraturas, entorses e luxações – se a fratura pode ser exposta, o que complicará o socorro a esta vítima, entorses e luxações não o são mas complicam a vida de quem os sofreu do mesmo jeito. Dor ao se movimentar e, muitas vezes, até impossibilidade de andar. Independente do que seja, trate como se fosse fratura e imobilize-o, não se preocupando em colocar o osso no lugar. Faça um acolchoado em volta do membro fraturado e prenda uma tala, que pode ser feita com o isolante térmico, por exemplo, prendendo-a acima e abaixo do local fraturado – nunca em cima. De tempos em tempos, verifique o pulso abaixo do local fraturado, para ter certeza de que sua tala não está interferindo na circulação.

Cortes e bolhas – a melhor forma de assepsia é lavar com água abundante e sabão neutro, se for suportável. Procure fazer um curativo com as mãos limpas e com gazes estéreis. No caso das bolhas, procure não deixar que elas se formem, colocando um esparadrapo no local. Portanto, ao menor sinal de irritação ou queimação nos pés, pare e cuide-os. Se elas já se instalaram, faça um curativo com um buraco no meio, para que distribua melhor a pressão exercida sobre elas. Procure não estourá-la. Se já o fez, trate-a como um ferimento qualquer, lavando-a e fazendo um curativo.

Calor, insolação e desidratação – em um país tropical como o nosso, este pode ser um problema freqüente, principalmente se você escolheu o litoral, durante o verão, para fazer uma caminhada com a mochila pesada. Não descuide a hidratação – nunca! Procure repor também o sal e esteja sempre protegido do sol, com chapéus, protetores solares etc. E lembre-se que a insolação (aumento da temperatura corporal), pode matar tanto quanto a hipotermia (veja abaixo).

Queimaduras – as de sol são facilmente evitadas com o uso de bloqueadores solares , roupas ventiladas e chapéus. O sol de montanha costuma ser muito forte – proteja-se adequadamente e pouco problema terá. Não esqueça de proteger os lábios também… As queimaduras feitas em fogo (fogareiros etc) devem ser tratadas apenas com água fria e cobertas com um curativo de gaze. Não passe nada sobre uma queimadura a não ser vaselina estéril. Não tem? Passe mel. E só – esqueça pastas de dentes e soluções caseiras. Se a queimadura for de 3º Grau e tiver afetado 10% do corpo (ou mesmo 2º grau que tenha afetado 20% do corpo), evacue imediatamente e procure um hospital.

Hipotermia – a nossa temperatura corporal é de 36-38o C. A hipotermia começa a ser definida quando a temperatura basal cai a cerca de 35o C. Hipotermia branda, apesar de não causar a morte, é bastante perigosa e pode ser de difícil detecção, já causando uma série de distúrbios como calafrios, destreza manual reduzida, cansaço, afeta o julgamento e a pessoa pode ficar propensa a discutir, além de não cooperar com a sua própria recuperação.

A hipotermia moderada vem associada a calafrios violentos, a coordenação muscular e as habilidades mentais são afetadas e é aqui que a pessoa pode simplesmente ‘se deixar morrer’, pois perde a capacidade de discernimento. Perdemos a consciência quando nosso corpo chega a 30o C.

Na hipotermia profunda, tanto a respiração quanto os batimentos cardíacos podem acontecer ao ritmo de apenas um ou dois por minuto! O coração pára quando a temperatura chega a 20o C. Não se morre de frio apenas em lugares extremos. Pode-se morrer de frio nas ruas de São Paulo, por exemplo. Basta, para isso, que a pessoa esteja mal alimentada e mal agasalhada.

E, se você está em uma viagem, caminhada ou expedição e alguém começa a sofrer de hipotermia, o que fazer? Aquecê-lo com seu próprio corpo e o corpo de outras pessoas é uma solução. Se possível, colocá-lo em uma banheira com água morna (mas isso não funciona com uma vítima de hipotermia profunda) – no caso das extremidades, um balde com água morna e curativos nos locais que sofreram o congelamento. Nunca esfregue um tecido congelado! E procure, o quanto antes, um hospital – lembre-se que descongelar e recongelar pode ser muito pior que mantê-lo congelado até o devido atendimento médico.

Mais importante que tudo isso: saia de casa programado e protegido – com roupas e comida suficiente para aquilo que se propôs a fazer. E não deixe a hipotermia avançar. No primeiro sinal de tremedeira involuntária, aqueça-se ou, se estiver molhado, se seque. Melhor que isso: não espere sentir frio para se aquecer – isso vale para qualquer lugar do mundo, em qualquer situação. É muito mais difícil se esquentar depois que o frio já se instalou…


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