Se fazer uma pequena caminhada em trilha exige algum nível de planejamento, de conhecimento do local e de prudência, fazer trekking em alta montanha, ou seja, naquelas com mais de 4.000 metros de altitude, exige muito mais do que isso. Além de ter um guia que conheça bem a região, e suas especificidades climáticas, e de estar provido de equipamentos adequados, será necessário adaptar o corpo, em geral acostumado a altitudes próximas do nível do mar.
Vale lembrar que atividades de alta montanha só podem ser realizadas fora do Brasil já que nossa montanha mais alta tem 3.014 metros de altitude: o Pico da Neblina, localizada no estado do Amazonas, na fronteira com a Venezuela. Assim, entre os destinos mais comuns dos brasileiros que desejam ter essa experiência estão os nossos países vizinhos, Bolívia, Peru e Argentina. Além disso, é importante ter em mente que se trata de uma atividade de risco, e em certas ocasiões um erro ou um descuido podem resultar em uma fatalidade. Por isso, pesquisar é o primeiro passo para iniciar o planejamento de uma atividade como essa.
Hoje com a Internet e com as inúmeras agências especializadas em turismo de trekking, tudo fica mais fácil. Ainda assim, é essencial estar informado sobre os desafios que vem pela frente. Conhecer bem o local aonde irá e como é o clima na época de sua viagem vai definir a roupa, o tempo necessário e os equipamentos que deve levar. É bom frisar que trekking em alta montanha vai exigir disponibilidade de tempo porque as atividades são desenvolvidas em vários dias – especialmente para que o corpo se acostume com a altitude, se aclimate.
Deslocar-se rapidamente para altitudes em torno de 2.500 metros já costuma provocar mal estar e desconforto em pessoas sem experiência. Entretanto, com a adaptação correta, a maioria das pessoas que tenham um preparo físico mínimo conseguirá alcançar altitudes como 5.000 ou 5.500 metros (que é a altitude do acampamento base do Everest, só como exemplo).
Acima disso, o processo fica mais sofrido e exige mais tempo para o corpo. Isso ocorre porque quanto mais alto estamos, a quantidade de oxigênio diminui, bem como a pressão exercida pela atmosfera e a temperatura, causando expansão dos gases. Assim, ficamos com menos moléculas de oxigênio disponíveis em cada respiração, e fica mais frio.
Por isso, uma das atitudes mais importantes a ser tomada é a aclimatação, que consiste em preparar o corpo, aos poucos, para ir avançando na subida da montanha, onde o ar é mais rarefeito. Especialmente quem não está acostumado a grandes altitudes ou está vivendo sua primeira experiência.
Para facilitar esse processo, tome líquido a todo instante, não deixe de fazer nenhuma das refeições, leve barras energéticas (powerbars) para as caminhadas de aclimatação, respire pelo nariz e caminhe pausadamente, pois a falta de oxigênio será perceptível. Também faz parte do treino passar o dia numa altitude mais elevada e voltar para dormir no nível anterior.
O ambiente de alta montanha pode variar muito conforme a época do ano, a localização e a altitude. Neste tipo de caminhada o montanhista poderá enfrentar neve, gelo, glaciares, sedimentos das geleiras (morenas ou morainas), rocha ou terra, e tudo isso vai influenciar os equipamentos que serão necessários em sua expedição.
Ressaltamos que o foco desse texto é caminhada em alta montanha, e não escalada, que é tecnicamente mais difícil e exige conhecimentos e outros materiais específicos.
Equipamentos básicos para um trekking de alta montanha
Subir uma alta montanha exigirá equipamentos mais técnicos do que os utilizados em um trekking comum, em baixa altitude. Para quem está iniciando ou não pretende praticar este tipo de atividade com regularidade, vale a pena alugar alguns dos equipamentos. É fácil encontrar lojas de aluguel nas cidades mais próximas das montanhas, ou as próprias agências podem oferecer parte desse material, caso seja utilizado o serviço delas.
Se a opção for adquirir alguns equipamentos, vale lembrar que este investimento deve ser feito com critério, e não apenas considerando o preço mais baixo. Afinal, provavelmente você estará em um lugar de difícil acesso e não seria bom ficar na mão por causa de um equipamento de baixa qualidade ou inapropriado.
Confira a seguir os principais equipamentos que devem ser levados numa caminhada em alta montanha:
Barraca de alta montanha – Os principais quesitos a serem considerados são impermeabilidade, resistência ao vento, qualidade da armação (para aguentar o peso da neve) e peso total da barraca (caso vá carregá-la). Para alta montanha, existem as chamadas barracas de 3 ou 4 estações. As de 3 suportam condições meteorológicas moderadas, ou seja, verão, primavera e outono. As de 4 estações são apropriadas para condições extremas em alta montanha, como chuvas torrenciais, tempestade de neve, ventos fortes etc. Não são boas para ambiente quentes, pois isolam o clima externo e acabam se tornando uma sauna. Por isso, avalie bem qual o seu objetivo. As barracas produzidas pela Trilhas & Rumos são mais apropriadas para atividades moderadas em montanha, como a Cota 2, que tem grande estabilidade, é fácil de montar e comporta duas pessoas; ou a Bivak Alumínio, muito leve (apenas 1,7 k), para uma pessoa e ideal para ser carregada na mochila.
Saco de dormir – Normalmente é usado o de modelo sarcófago, e deve ser adquirido conforme a temperatura que vai ser enfrentada, e sua própria resistência ao frio. Para uso em alta montanha, deve sempre suportar temperaturas negativas, com modelos que variam entre 8 e 40 graus negativos, o que influi diretamente eu seu peso. O enchimento pode ser de fibras sintéticas ou de plumas de ganso. O saco de dormir mais técnico da Trilhas & Rumos é o Super Pluma Gelo que resiste a 15 graus negativos em condições extremas, e pesa 1,7 k.
Isolante térmico – Essencial para ser usado dentro da barraca, embaixo do saco de dormir, e garantir a eficiência dos outros dois equipamentos citados. Pode ser rígido ou inflável. Dependendo da montanha, pode ser uma boa estratégia usar um sob o outro. Para os infláveis, é fundamental levar um kit de reparo. A Trilhas & Rumos possui um modelo rígido básico, leve e muito eficiente: o isolante Matratze.
Mochilas – O tipo de atividade e o tempo de permanência vão definir a melhor mochila. Entretanto, por se tratar de uma caminhada de muitos dias, é provável que você precise de uma mochila cargueira. Busque aquela que tenha um tamanho que seja compatível com a capacidade que você consegue carregar e que seja o mais confortável possível, especialmente em seus encostos e barrigueira. Minimize o peso, carregue apenas o necessário. A Trilhas & Rumos tem uma linha de mochilas técnicas que podem ser usadas em alta montanha, como a Crampon 77 Tech, a Crampon 72 Tech (estas duas com capa de chuva embutida) ou aMochila de 75 lts Montanha, todas feitas em tecidos resistentes.
Bastões de caminhada – Ajudam a diminuir o impacto nos joelhos durante as decidas, e proporcionam equilíbrio, servindo de apoio extra. São encontrados em diversos modelos e preços, sendo os mais indicados os que permitem ajuste na altura.
Crampons – São uma espécie de base com grampos pontudos que se encaixam embaixo das botas, para garantir o atrito na neve. Em caminhadas podem ser utilizados os modelos mais básicos. O sistema de fixação pode ser por fitas, engate rápido (esse funciona apenas com botas específicas) ou semi-automáticos (sem encaixe na frente, apenas atrás).
Esquis e raquete de neve – Se o local para onde você vai tem neve fofa, será necessário o uso desse item, em geral feito em alumínio. O ideal é que o modelo possa ser utilizado com as botas de caminhada ou com as botas duplas. A raquete de neve é fácil de transportar, leve e fácil de tirar e colocar, e pode ser utilizada com crampons. Não exige maiores conhecimentos para sua utilização. Já os esquis, exige um pouco mais de equilíbrio e conhecimento.
Lanternas de cabeça – Atualmente quase todas usam lâmpadas com tecnologia LED (de alta potência), com capacidade de regular a intensidade da luz, e com alta durabilidade das baterias. Se possível tenha mais de uma lanterna com você, para ser usada dentro da barraca ou para emergência. Pode ser uma bem pequena.
Fogareiros – Talvez seja o mais importante equipamento. Além de te propiciar alimentação quente, vai servir para derreter gelo para transformar em água, em locais com neve. Hoje os fogareiros à combustível líquido (que devem ser transportados em garrafas metálicas) são os mais usados. Geralmente são multi-combustíveis, o que facilita muito (gasolina e diesel são encontrados em praticamente todos os lugares).
Bússola e GPS – Equipamentos fundamentais, mas que provavelmente será usado pelo guia, ou pelos mais experientes da expedição.
Outros acessórios – Leve sempre óculos de sol com fator UV e bloqueador solar, porque existe um grande perigo de queimaduras provocadas pelo sol em alta montanha, e você estará exposto por muitos dias.
Alimentação e hidratação: pontos fundamentais
A altitude inibe o apetite e a sede, mas é recomendável sempre seguir se hidratando e comendo para não perder energias nem forças. A comida deve ser leve, calórica, e de rápido cozimento (o ponto de ebulição em altitude diminui consideravelmente). É comum o uso de comidas liofilizadas em alta montanha, que passam por um processo de desidratação, que são mais leves de carregar e tem conservação prolongada.
Sobre hidratação, a partir dos quatro mil metros é muito comum que os sintomas de uma desidratação sejam confundidos com o chamado “mal da altitude” ou “mal das montanhas”. Esta desidratação pode dar início a um dos mais comuns sintomas do mal das montanhas, a anorexia, afetando a interpretação do cérebro para a falta de líquido no organismo, formando assim um ciclo perigoso. Por isso, é fundamental beber água na montanha mesmo sem sentir sede. Também dê preferência aos alimentos úmidos e preparados à base de água.
Durante a aclimatação, ou se estiver esperando uma janela de tempo bom para subir ao cume da montanha, beba muita água, abuse dos líquidos, pelo menos quatro litros por dia. Nas ascensões, procure calcule pelo menos 250 ml por hora. Será pouco, mas suficiente para não prejudicar o desempenho.
E lembre-se de purificar sua água. A forma mais usual é colocar duas gotas de Hipoclorito de Sódio a 2,5% em cada litro de água e esperar 30 minutos antes de beber.
Vestuário e calçado adequado são essenciais
O melhor e mais recomendado esquema de proteção contra o frio e vento em alta montanha é o sistema de camadas. A camada base, ou segunda pele, fica em contato com o corpo e deve ser de um material que permita a saída da transpiração. Há uma série de opções de vestuário com tecidos técnicos.
para compor estas três camadas.
Em se tratando de alta montanha, os gorros, luvas e meias não são apenas acessórios. Dependendo do local e do frio, as luvas e meias devem seguir o mesmo esquema de camadas. Manter os pés secos e sem bolhas é fundamental para garantir uma boa caminhada, por isso evite usar meias úmidas por tempo prolongado. E aqui vai um bom conselho: se você estiver com os pés gelados, cubra sua cabeça. Isto porque mais ou menos a metade do calor do nosso corpo escapa através da cabeça.
Escolher o calçado adequado é outro item importante para complementar sua vestimenta para a alta montanha. Entre as botas de caminhada mais comuns, existem as de cano alto e as de cano baixo. As primeiras, apesar de serem mais pesadas, podem evitar uma torção de pé. Hoje é possível escolher botas de materiais mais modernos, que proporcionam resistência e conforto, como a Cordura e o Gore-Tex.
Para alta montanha, especialmente se tiver neve ou gelo, será preciso usar também as chamadas botas duplas, mais rígidas, robustas e impermeáveis. Existem vários tipos, que devem ser escolhidos conforme as condições do local aonde você vai: semi-rígidas (mais leves), plásticas (mais robustas e só usadas na parte mais alta da montanha, já com neve) e “overboot” (botas polainas, muito grandes e pesadas, para situações mais extremas).
Veja detalhes nos textos Roupas o inverno nas montanhas, Com que roupa eu vou?, Tecidos respiráveis eComo escolher sua bota.
Segurança, sempre!
Por fim, sempre é recomendável estar acompanhado de um guia experiente, que conheça bem o local, e viajar em grupo, com três ou mais pessoas. Caso ocorra algum acidente um deles pode ficar com o acidentado e o outro pode ir pedir ajuda. Prefira viajar com gente conhecida, já que com a altitude a falta de oxigênio pode provocar mudanças no humor e no temperamento. Levar rádios para a comunicação entre os participantes da expedição também é um cuidado importante, especialmente se for necessário se separarem temporariamente, por algum motivo. Além disso, deixe sempre informações sobre seu paradeiro, seja com familiares, agências, clubes e federações ou mesmo pessoas locais.
Fonte:
Livro Escalada e Trekking em Alta Montanha
Autor: Davi Augusto Marski Filho
Edição do Autor, 2010
www.marski.org
Por Márcia Soares, em novembro de 2010.
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